Seja você um corredor iniciante ou um maratonista experiente, saiba que é impossível chegar muito longe sem o combustível adequado. E embora precisemos de combustível para chegar aonde queremos, nossos corpos são ligeiramente mais complexos do que um carro abastecido por quilometragem.
Vamos nos aprofundar nos fundamentos nutricionais que todo corredor precisa saber.
O que é alimentação para corredores?
No mundo da corrida, alimento é combustível, independentemente do seu nível. Os tipos de alimentos que você escolher determinarão quanta energia você terá para a corrida e seu desempenho em geral. Escolha errado e você poderá abrir caminho para corridas mais lentas – ou pior, para algumas cãibras no meio do percurso ou problemas estomacais que te forçarão a parar mais cedo. Certamente, essa não é a melhor sensação para quem esperava correr alguns quilômetros.
Dito isso, como você pode criar um plano alimentar que atenda às suas metas de corrida? Vamos por partes.
Ao elaborar a alimentação perfeita para corredores (sim, estamos falando de você!), é importante considerar sua necessidade calórica, que é influenciada pelos seguintes fatores:
- Altura
- Peso
- Gasto energético
- Distância percorrida na corrida
E seu plano alimentar como corredor também deve incluir uma combinação bem equilibrada dos três macronutrientes, para abastecer o corpo e facilitar a recuperação:
- Carboidratos
- Proteínas
- Gorduras
A importância dos macronutrientes
Os macronutrientes são os "três grandes" componentes da nutrição e vitais para todos os atletas. Mas você sabia que seu objetivo e nível de atividade determinam suas proporções ideais de macronutrientes? Por exemplo, exercícios cardiovasculares, como a corrida, exigem uma alta ingestão de carboidratos para impedir que os estoques de energia se esgotem.
Cada macronutriente é associado a uma função específica:
- Carboidratos para energia
- Gorduras para fonte secundária de energia
- Proteínas para recuperação muscular
Carboidratos para energia
O carboidrato é a fonte de combustível mais importante para a atividade física. Embora a proteína e as gorduras sejam essenciais para uma alimentação equilibrada, acertar a proporção de carboidratos adequada pode ser um fator decisivo para você progredir ou estancar na corrida. Claro, o equilíbrio é fundamental, e exagerar nos carboidratos pode causar algum desconforto digestivo desagradável durante uma corrida.
Como mencionamos neste artigo, nem todos os carboidratos são iguais. Existem diversos tipos de carboidratos, e o tipo que você escolhe pode influenciar o seu desempenho. Ao ingerir carboidratos, eles são decompostos em glicose (açúcar), que entra no sangue e é usada como energia. Qualquer excesso de glicose pode ser armazenado no fígado ou tecido muscular como glicogênio para quando for necessário.1
Durante a atividade física, o corpo utiliza o glicogênio armazenado como combustível, mas não se trata de um suprimento constante. O glicogênio pode se esgotar em 120 minutos, o que é suficiente para afetar o desempenho.
Então, qual a quantidade de carboidrato que você deve ingerir antes de correr? Em geral, as diretrizes aconselham os corredores a tentar consumir entre 30 e 60 g de carboidratos por hora durante três horas em uma corrida de resistência. Com base nessa orientação, recomenda-se que os atletas consumam 60 g (a 90 g) de carboidratos por hora de exercício para atividades que durem mais tempo, como uma maratona.²
Embora esse seja um bom ponto de partida, ele também é bastante genérico. A proporção de carboidratos para gordura dependerá muito da intensidade e duração da sua corrida. Não deixe de conferir nosso artigo sobre sistemas de energia para uma análise aprofundada de como o alimento impulsiona a sua corrida. Isso te ajudará a ajustar alimentação antes da corrida para obter o máximo de desempenho com base em seu objetivo.
Gorduras para fonte secundária de energia
Ainda que os carboidratos sejam os mais falados no mundo da corrida, a gordura da alimentação é uma importante fonte secundária de combustível. Na verdade, uma recomendação comum é que 30% do total de calorias venham da ingestão de gorduras.⁴ Além do mais, um estudo envolvendo 86 mulheres que correm pelo menos 32 km por semana descobriu que aquelas com menor ingestão de gordura tinham 2,5 vezes mais probabilidade de sofrer uma lesão.3
Proteínas para recuperação muscular
Embora os carboidratos e as gorduras sejam fontes vitais de energia e te ajudem a bater aquela meta na corrida, a sua forma de ver os alimentos como combustível não deve parar por aí. Parte da sua estratégia deve priorizar a reparação e a recuperação – e é aqui que a proteína vira o centro das atenções.
A Ingestão Diária Recomendada (IDR) de proteínas é de 0,8 g por quilo de peso corporal.5 Para quem pratica atividades de resistência, como correr uma maratona, pode ser benéfico dobrar essa quantidade, buscando uma ingestão proteica entre 1 e 1,6 g por quilo de peso corporal diariamente.6
Os perigos da falta de combustível
Algo totalmente fora de cogitação para corredores de resistência é correr em jejum. Lembre-se, alimento é combustível, especialmente em corridas longas, e seu corpo precisa disso. Sair para correr em jejum, após uma baixa ingestão de carboidratos ou simplesmente pular aquela refeição pós-corrida pode ter consequências prejudiciais. Isso não apenas dificulta a recuperação muscular, afetando assim o seu desempenho na corrida, mas também causa estragos na sua saúde em geral.
Uma consequência comum da falta de combustível é o RED-S, ou Deficiência Relativa de Energia no Esporte, antes chamada de Tríade da Atleta Feminina. O RED-S acontece quando um atleta não ingere calorias suficientes para compensar sua produção de energia, e isso pode acontecer com qualquer um.7
Alguns dos sinais de alerta do RED-S são:
- Doenças frequentes, como resfriados e tosse
- Fadiga
- Inchaço e sintomas de síndrome do intestino irritável (SII)
- Amenorreia (interrupção da menstruação em mulheres)
- Baixa testosterona e baixo hormônio luteinizante (homens)
- Redução da densidade óssea mineral
- Aumento nos perfis de gordura no sangue8
A baixa disponibilidade energética não é um problema apenas durante a corrida, mas também depois dela. É possível que você não sinta fome depois de uma corrida, mas não repor o combustível perdido pode comprometer a sua recuperação. Se o glicogênio não for reposto nos músculos, o reparo e a recuperação serão prejudicados, diminuindo seu desempenho nas corridas e te deixando suscetível a lesões. E essa é a última coisa que qualquer corredor quer (ou precisa) quando está atrás de um objetivo.
O RED-S e a falta de combustível são problemas sérios e podem ter impactos físicos e mentais de longo prazo nos atletas, prejudicando seu desempenho e saúde. Por isso, é essencial abastecer seu corpo da forma correta, garantindo que ele esteja preparado para correr mais longe e se sentindo bem ao fazê-lo.
Hidratação para corredores
Não tem como negar a importância da alimentação para os corredores, mas a hidratação também deve estar em primeiro lugar. Ainda assim, este combustível líquido é frequentemente esquecido. Um estudo de O'Neal et al. (2011) constatou que 70% dos corredores vivenciaram uma ocasião em que a desidratação afetou o desempenho deles, e 45% acreditam que a desidratação resultou em efeitos adversos em sua saúde.9
E a hidratação é extremamente importante! Ela é especialmente fundamental para:
- Regulação da temperatura corporal
- Manutenção do volume de plasma no sangue
- Regulação da função cognitiva
Ao correr, a sua temperatura corporal invariavelmente vai ficar mais alta, fazendo você suar e reduzindo seu volume de plasma (a parte líquida) no sangue. Isso aumenta a sua frequência cardíaca, fazendo com que você se canse mais rapidamente.
O American College of Sports Medicine recomenda a ingestão de 145 a 355 ml de líquidos a cada 15-20 minutos durante uma maratona.10 No entanto, cada pessoa é única. Se você ingerir seus 355 ml e ainda se sentir desidratado, não hesite em aumentar essa quantidade! Para quantidades mais individualizadas, você pode estimar sua taxa de suor medindo seu peso corporal antes e depois do exercício, a fim de determinar de quanto líquido você precisa. No fim das contas, o objetivo é prevenir a desidratação excessiva durante o exercício, então essa ingestão deve se adequar às suas necessidades.
A necessidade de sal
Além da perda de fluídos durante a corrida, os atletas também perdem eletrólitos, mais especificamente sódio, através do suor. A quantidade média de suor perdida por corredores é de 1.200 ml por hora, o que pode conter entre 115 mg e 2.000 mg de sódio.
E isso é importante porque o desequilíbrio de sódio pode causar muitos sintomas indesejados, como:
- Desconforto gastrointestinal
- Enjoo
- Fadiga
- Tontura
- Concentração reduzida
Então, se você costuma sentir desconfortos estomacais ao correr, pode ser que seu corpo esteja com baixo teor de sódio. Algumas pesquisas sugerem que atletas de resistência consumam entre 300 e 600 mg de sódio por hora.11 Isso pode ser feito por meio de comprimidos de sódio, eletrólitos ou bebidas energéticas.
Quais suplementos podem ser benéficos para corredores?
Embora tenhamos enfatizado a importância dos macronutrientes na alimentação de um corredor, os micronutrientes são igualmente essenciais para a infinidade de processos metabólicos que ocorrem no seu corpo. A maioria dos micronutrientes pode ser ingerida por meio da alimentação, mas os corredores veganos ou vegetarianos podem se beneficiar da suplementação de nutrientes não encontrados em alimentos e bebidas à base de plantas, como ferro heme ou vitamina B12.
Veja esta breve lista de micronutrientes, seus benefícios e em quais alimentos eles podem ser encontrados:
Vamos recapitular
Se há um aprendizado importante a ser extraído deste guia é este: para os corredores, alimento é combustível. A forma como você se alimenta é fundamental para o seu desempenho, recuperação e simplesmente para o quão bem você se sente durante uma corrida. Ela também é uma ferramenta poderosa para aprimorar suas habilidades não apenas como corredor, mas como atleta em geral.
Acerte as proporções, aperfeiçoe a alimentação e priorize a hidratação, o sódio e os suplementos conforme necessário. Quando encontrar o equilíbrio perfeito, o seu PB ficará mais perto do que nunca.
Fontes
[1] Holesh, J. E., Aslam, S., & Martin, A. (2023). Physiology, Carbohydrates. In StatPearls. StatPearls Publishing.
[2] Jeukendrup A. (2014). A step towards personalized sports nutrition: carbohydrate intake during exercise. Sports medicine (Auckland, N.Z.), 44 Suppl 1(Suppl 1), S25–S33. https://doi.org/10.1007/s40279-014-0148-z
[3] Gerlach, K.E., Burton, H.W., Dorn, J.M. et al. (2008) Fat intake and injury in female runners. J Int Soc Sports Nutr 5, 1. https://doi.org/10.1186/1550-2783-5-1
[4] Pramuková, B., Szabadosová, V., & Soltésová, A. (2011). Current knowledge about sports nutrition. The Australasian medical journal, 4(3), 107–110. https://doi.org/10.4066/AMJ.2011.520
[5] How much protein do you need every day? (2023) Harvard Health. Available here. (Accessed: 12 March 2024).
[6] (No date) Here’s how much protein you should really be eating. Available here. (Accessed: 17 March 2024).
[7] Statuta S, M., Asif I, M., Drezner J, A . (2017). Relative energy deficiency in sport (RED-S). British Journal of Sports Medicine:51,1570-1571.
[8] Dave, S, C & Fisher, M. (2022). Relative energy deficiency in sport (RED-S). Current Problems in Pediatric and Adolescent Health Care, 52(8).
[9] O'Neal, E. K., Wingo, J. E., Richardson, M. T., Leeper, J. D., Neggers, Y. H., & Bishop, P. A. (2011). Half-marathon and full-marathon runners' hydration practices and perceptions. Journal of athletic training, 46(6), 581–591. https://doi.org/10.4085/1062-6050-46.6.581
[10] UCSF Health (2023) Running a marathon: Race day success, ucsfhealth.org. Available here. (Accessed: 17 March 2024).
[11] Veniamakis, E., Kaplanis, G., Voulgaris, P., & Nikolaidis, P. T. (2022). Effects of Sodium Intake on Health and Performance in Endurance and Ultra-Endurance Sports. International journal of environmental research and public health, 19(6), 3651. https://doi.org/10.3390/ijerph19063651
[12] Strazzullo, P., & Leclercq, C. (2014). Sodium. Advances in nutrition (Bethesda, Md.), 5(2), 188–190. https://doi.org/10.3945/an.113.005215
[13] The importance of potassium (2019) Harvard Health. Available here. (Accessed: 17 March 2024).
[14] Office of dietary supplements - iron (no date) NIH Office of Dietary Supplements. Available here. (Accessed: 17 March 2024).
[15] Office of dietary supplements - vitamin D (no date) NIH Office of Dietary Supplements. Available here. (Accessed: 17 March 2024).